O maior desafio que reencontro no regresso a casa é a minha falta de compreensão/disponibilidade mental para quem, na ponta da língua, traz a opinião não solicitada e o negativismo. Esta realidade não é novidade, mas cinco verões emigrada, ocupada a beber de outra cultura e formas de estar na vida, fez-me esquecer o que em parte me fez ir. Porque já cá me fazia infeliz.

(Não, não vou voltar para onde vim.
Vou falar sobre isso).

Sendo Portugal o meu país, que me formou e dá casa ao coração, ciente estou do saudosismo, do fado triste, da opinião pessoal fogosa, do insulto e do elogio na mesma frase. (É aquela necessidade imperativa de dar a nossa opinião, sem olhar aos sentimentos de quem a recebe, porque “é só a minha opinião! Tenho direito a ela, certo?” Sobre o trabalho, personalidade, cor de camisola ou escolhas amorosas. É a minha opinião! E vou dá-la!)
Porém, o comodismo a esta realidade continua a não me fazer bem e tão pouco a torna aceitável. Nem hoje ou amanhã. Porque me magoa.
Aprendi, lá fora, que ouvir o outro não é aproveitar o tempo em que ele fala para estruturar a minha opinião. Não é mostrar um falso silêncio, um falso ouvir, um falso respeito. Ouvir é ouvir.
Falo das conversas de café, em família, com amigos ou aqueles a quem gostamos de falar. E que gostaríamos de manter esses laços. Ouvir o outro, que nos fala do que quer que seja, não significa que a nossa opinião esteja a ser solicitada.

Quando procuro alguém para conversar, nem sempre procuro opinião. Procuro falar, que alguém construa aquele pensamento comigo, para que eu consiga aprender e até ver outras perspetivas que sozinha não me é possível. Construir pensamentos envolve ouvir, fazer perguntas, imaginar cenários e explorar caminhos em conjunto. E se procurar opinião, peço-a. Sem que isto, ou o vice-versa, seja pouco amigável ou até arrogante. Porque ninguém nasce a saber tudo, ninguém nasce a saber operar sozinho.
Falar sobre sentimentos, trocar ideias, pedir para ouvir não é fraqueza. É talvez este tabu irritante, de expor e lidar com sentimentos, que nos faz jovens tão ansiosos e com medo de sermos.
De forma geral, seria negativismo da minha parte dizer que somos todos assim. Felizmente não o é.
A verdade é que desde que voltei e que partilho as minhas vontades, do presente e do futuro, que me impõem obstáculos: “Porque aqui não é assim”, “porque eu não faria assim”, “porque agora não é o momento”, “porque se tu isto, eu aquilo”, “porque não devias”, “porque seres assim, isto e aquilo”, “não devias falar”, “isso é só estúpido e desnecessário”…
E fico eu a pensar porque dou espaço a opiniões levianas e porque permito que os outros tomem decisões imaginárias sobre a minha vida, quando todo o envolvente me pertence. Somente a mim. Tudo! O tempo, dinheiro, consequências, estabilidade emocional, felicidade e trabalho é do meu lombo que sai.
– “Então, não se pode dar-te uma opinião?!”
– É fundamental escolher as palavras.
(Ouço já um coro que grita “deixa de ser sensível!”)

O “posso dar-te/queres a minha opinião” é o saber falar. Seja com quem for. Tenho em mim que as pessoas que despejam opinião e crítica de foro pessoal, pensam-se donas do santo Graal e por isso toda a humanidade precisa de os ouvir. Por norma, o cenário que pintam é sempre tão triste e assustador que me faz pensar como sobrevivem eles no mesmo mundo que eu. Penso também que se acatasse acabaria despida, no canto de um quarto escuro. À espera que o dia perfeito chegasse para finalmente ter coragem de viver a vida que, em tempos absurdos, havia ambicionado.
(Sai-me um peso dos ombros).

Acredito que a crítica construtiva é a única que nos ascende e a opinião solicitada é a que nos conforta. É o tal conselho amigo, que mesmo vindo de um amigo deve ser permitido acesso. Talvez fosse mais fácil aceitar a desgraça, o triste fado e viver uma vida pouco feliz e menos conflituosa. Como antes. Mas agora já vivi o outro lado. Sei que existe.

(E não, não vou voltar para onde vim. Apesar de sentir muita dificuldade em aceitar a esta forma de vida, da crítica oca e do negativismo imediato. Eu pertenço aqui).

Recusando-me ficar no quarto escuro, opto por lutar estas batalhas com quem luta como eu. De forma positiva e atenta no impacto que as palavras têm no outro. Criar um ciclo de pontos de vista benéficos, onde a conversa discordante não tem armas, onde o falar alto ou baixo é aceitável desde que as intenções sejam só as boas. Para nos deitar ao chão, já basta todo o resto.

Ps: Se alguém se sente livre para opinar sobre a tua vida, sem permissão ou contexto, certamente terás liberdade de a recusar. No mesmíssimo minuto. (Independentemente da tua profissão).

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